09/12/2010 VALOR ECONÔMICO
Poucas pessoas tinham dúvida, na área técnica, que a estimativa para 2011 da arrecadação administrada pela Receita Federal do Brasil (RFB), que constava da proposta orçamentária encaminhada ao Congresso em agosto, estava superestimada. Por uma razão muito simples: a previsão do governo era que a receita administrada pela RFB chegaria a 16,24% do PIB. Esse percentual estava muito acima até mesmo do registrado em 2007 (15,69% do PIB), quando ainda existia a famosa CPMF, por meio da qual, naquele ano, o governo arrecadou R$ 36,5 bilhões.
Para atingir a previsão em 2011, a RFB teria que elevar a arrecadação administrada em 1,48 ponto percentual do PIB em relação ao estimado para este ano, o que seria um feito impressionante. Quando a proposta orçamentária foi enviada ao Congresso, alguns especialistas levantaram a hipótese de que o governo teria "esticado" a receita para 2011 com o objetivo de financiar as obras do PAC 2, o carro-chefe da campanha da candidata Dilma Rousseff à Presidência da República.
Esta semana, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, que continuará no cargo no próximo governo, anunciou corte nos gastos públicos para que as contas do governo federal possam ser fechadas em 2007 com o superávit primário previsto. Segundo ele, os cortes poderão atingir até mesmo as obras do PAC.
Arrecadação cresce em ritmo mais acelerado que a economia
Em uma interpretação livre do que disse o ministro da Fazenda, pode-se entender que não havia receita para financiar as obras do PAC 2. É bom lembrar que a meta de superávit primário do setor público foi reduzida de 3,3% do Produto Interno Bruto (PIB) para 3,1% do PIB, depois que a proposta orçamentária foi encaminhada ao Congresso. Portanto, não haveria razão para o corte, se a proposta orçamentária original estivesse equilibrada.
Não estava. Na terça-feira, o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, avisou os integrantes da Comissão Mista de Orçamento do Congresso que a previsão da receita administrada pela RFB para 2011 está superestimada em R$ 12 bilhões. Segundo o ministro, a arrecadação de tributos não está acompanhando o ritmo de crescimento da economia.
Há, efetivamente, dois problemas que merecem ser considerados. O primeiro está relacionado às previsões da Secretaria da Receita Federal. Na proposta orçamentária para este ano, a RFB estimou que a arrecadação do Imposto de Renda este ano ficaria em R$ 207,7 bilhões. Agora, no relatório de avaliação do 5º bimestre, a previsão caiu para R$ 188,7 bilhões - um erro de R$ 19 bilhões, algo superior a 0,5% do PIB deste ano. Para 2011, a previsão da receita administrada feita pela RFB era de R$ 632 bilhões. Aos parlamentares, o ministro disse que ela ficará em R$ 620 bilhões - um erro de R$ 12 bilhões.
O segundo problema que precisa ser analisado é o comportamento da arrecadação do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica. Como era previsível, o governo não poderia contar muito com a receita do IRPJ este ano. Em ano de recessão, as empresas costumam registrar prejuízo e compensá-los no Imposto de Renda nos anos seguintes, como a legislação permite.
Muitas delas registraram prejuízo expressivo em 2009 e, este ano, estão pagando menos IR. Além disso, é razoável que a recuperação da rentabilidade das empresas ocorra em ritmo mais lento. Recentemente, o secretário da RFB, Otacílio Cartaxo, solicitou uma investigação para saber por que as receitas do IRPJ e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) estão descoladas dos demais tributos, ou seja, subindo menos. Os resultados dessa investigação ainda não foram divulgados.
Mesmo com o fraco desempenho da receita do IR e da CSLL, a tabela abaixo mostra que a arrecadação administrada pela RFB crescerá este ano, em proporção do PIB, em relação a 2009. Isso significa que a receita administrada está crescendo em ritmo mais acelerado do que a economia. A RFB tem insistido que é possível obter este ano um crescimento real de 12% na arrecadação administrada. A previsão de crescimento real do PIB é de 7,5%.
Se a receita administrada não atingiu ainda o nível de 2008, a arrecadação total do governo federal, no entanto, baterá recorde este ano. A última projeção divulgada pelo governo prevê receita total equivalente a 23,97% do PIB, superior ao obtido em 2008, conforme a tabela abaixo. Nesse cálculo não foram considerados os R$ 74,8 bilhões obtidos com a venda de 5 bilhões de barris petróleo à Petrobras, no processo de capitalização da empresa.
Mesmo que a previsão para as receitas administradas pela RFB fique em R$ 620 bilhões em 2011, com o corte de R$ 12 bilhões sugerido pelo ministro do Planejamento aos parlamentares, ela ainda seria equivalente a 15,9% do PIB - acima, portanto, do registrado em 2008. O governo não pode, portanto, queixar-se da receita.