09/12/2010 SINDIFISCO/MG
“A grande mudança no sistema tributário brasileiro será implementada pelas administrações tributárias”, afirma Mizabel Derzi
Com a proposta de discutir os aspectos jurídicos, administrativos, políticos e socioeconômicos envolvidos na proposta de reforma do sistema tributário brasileiro, teve início ontem (6), em Belo Horizonte, o seminário “Reforma Tributária Constitucional”. O evento é promovido em parceria pela Escola de Administração Fazendária, representantes do Poder Público, representantes do empresariado, entidades na área de Direito Tributário, pelo Fisco das três esferas e entidades de classe. Convidado para compor a mesa de abertura, o presidente do SINDIFISCO-MG, Lindolfo Fernandes de Castro, representou a categoria dos auditores fiscais da Receita Estadual de Minas Gerais. A diretora da Esaf, professora Ana Carla Crispim, observou que a proposta do evento é, antes de tudo, a de qualificar o debate em torno do tema proposto, discutindo propostas, confrontando posições e praticando o diálogo, mas, sem a pretensão de oferecer respostas. A observação foi reforçada pelas palavras da professora Mizabel de Abreu Machado Derzi, diretora da Associação Brasileira de Direito Tributário, que ressaltou a necessidade de que a discussão iniciada durante o evento seja tratada de forma contínua. “Reforma tributária não é um fenômeno isolado, é fenômeno contínuo, permanente, que demanda altos estudos, adequados à nossa democracia”. Encarregada de ministrar o primeiro painel da tarde, enfocando os “Aspectos Jurídicos da Reforma”, Mizabel Derzi começou analisando os reflexos do federalismo em relação ao sistema tributário brasileiro. Segundo a professora, atribui-se à forma federativa de Estado a responsabilidade de acarretar uma maior complexidade ao sistema tributário, do que ocorreria em um Estado unitário. “Dizem que o federalismo brasileiro, depois de outorgar aos estados competência de arrecadar, dificultou muito a situação”, observou, explicando que vários projetos de reforma surgiram com o intuito de resolver isso. Mizabel Derzi, fez questão de ressaltar, entretanto, que, em sua opinião, o federalismo é uma forma de Estado que deve ser cultivada entre nós. A painelista citou exemplos de países federalistas que resolveram com muita propriedade questões tributárias, mas com o cuidado de ressaltar o perigo de copiarmos experiências estrangeiras. “Transplantes legais são indevidos, porque as culturas são diferentes”, afirmou. Outro tópico abordado por Mizabel Derzi foi federalismo e guerra fiscal. “É um erro pensar que, no sistema tributário, se faz uma reforma sem examinar a guerra fiscal. Não existe modelo de discussão de reforma tributária sem um estudo profundo da concorrência”, afirmou. Ao examinar a questão da carga tributária, a professora, dirigindo-se aos representantes do empresariado, enfatizou: “Tirem da cabeça que haverá uma reforma do sistema tributário para diminuir carga. Se a carga não aumentar, já é uma vitória”. Em seguida, analisou o problema do sistema tributário em relação ao contribuinte e a carga tributária do ponto de vista da arrecadação, ressaltando que o ICMS é imposto regressivo, cujo ônus recai sobre quem menos pode. “O cidadão que ganha apenas um salário mínimo hoje suporta uma carga de 50%, sem ter condição para isso”, observou. Mizabel Derzi concluiu dizendo que as grandes reformas querem eliminar a complexidade e que isso não é lógico. “Nas sociedades complexas tudo é complexo. Glorificar a praticidade é abrir mão dos princípios constitucionais”, ressaltou. Para a professora, a grande mudança no sistema tributário brasileiro será implementada pelas administrações tributárias. Mizabel Derzi, ressaltou, ainda, a necessidade de restabelecer a transparência do sistema tributário brasileiro e a confiança entre os entes. O procurador da Fazenda Nacional Arnaldo Godoy prosseguiu o debate do tema. Para ele, a discussão dos aspectos jurídicos da reforma tem que partir da resposta à questão “que Estado queremos?” “Se queremos um Estado como temos hoje, ou a carga tem que ser aumentada, ou precisamos controlar os gastos com lupa e pente fino. Se queremos um Estado mínimo, então a carga está insuportável”. Arnaldo Godoy também falou sobre a constitucionalização de todo o sistema de direito tributário e observou que o Brasil é um país que não tem regras, mas transita no mundo dos princípios. Criticou, ainda, a qualidade das leis brasileiras, afirmando: “Temos uma legística tributária péssima”. O procurador observou que é preciso pensar num modelo de reforma capaz de enfrentar os grandes desafios postos e apresentou como referências positivas, a Carta de Brasília, documento produzido em fevereiro de 2003, e uma PEC de autoria do deputado federal Virgílio Guimarães (PT/MG), em tramitação no Congresso.