03/11/2010 CORREIO BRAZILIENSE
A sucessora de Lula, enfim, dá as diretrizes para o cenário econômico, mas especialistas duvidam de suas ideias
Câmbio
O que ela diz: Dilma garante que tomará todas as medidas necessárias para proteger o Brasil da guerra cambial. Manterá o regime de taxas flutuantes e lutará contra o protecionismo dos países ricos, que prejudica as exportações brasileiras. Não hesitará em enfrentar os desafios e os efeitos da crise mundial.
Como está hoje: o derretimento do dólar está deteriorando as contas externas. A previsão é de que o rombo passe dos US$ 50 bilhões neste ano e encoste nos US$ 100 bilhões em 2011. Há o temor que, com a enxurrada de importados, o país caminhe para a desindustrialização. Os juros altos atraem capitais especulativos.
O que espera o mercado: o governo deve baixar medidas para o controle na entradas e saída de capitais. A atuação do Ministério da Fazenda crescerá, inclusive na defesa do câmbio. Para que o dólar fique em um patamar aceitável é necessário o ajuste fiscal. Se os juros caírem, os papéis brasileiros perderão atratividade para os estrangeiros.
Política fiscal
O que ela diz: o governo não deve gastar acima do sustentável. A presidente eleita promete se esforçar pela melhoria da qualidade dos gastos públicos. Mas é contra qualquer ajuste fiscal que recaia sobre os programas sociais, os serviços essenciais à população e os investimentos necessários em infraestrutura.
Como está hoje: o governo botou o pé no acelerados dos gastos nos últimos dois anos para eleger a petista. A deterioração das contas é visível, a ponto de o Tesouro Nacional transformar dívida em receitas para fazer superavit primário. Com tanta gastança, o Banco Central mantém os juros acima do desejado.
O que espera o mercado: se o governo não fizer um ajuste fiscal, os juros ficarão constantes ou subirão no ano que vem. Todos esperam a desaceleração dos gastos. Há, porém, dúvidas sobre a austeridade da política fiscal. Sinalizará a direção do próximo governo o cargo ocupado por Antonio Pallocci, visto como um avalista.
Impostos
O que ela diz: fará uma reforma moderada no sistema de impostos brasileiro, que simplifique e atenue a tributação incidente sobre o setor produtivo. Pretende ampliar o Super Simples e valorizar o microempreendedor individual, além de incentivar investimentos por meio de uma legislação mais favorável.
Como está hoje: o Brasil tem um dos mais pesados sistemas de impostos do mundo. A carga tributária chega a 37% do PIB, encarecendo a produção e tirando competitividade dos produtos no exterior. O governo não consegue cortar impostos porque precisa de dinheiro para bancar a gastança.
O que espera o mercado: Dilma não se comprometeu com uma reforma tributária. Porém, não realizará algo amplo. Os analistas acreditam que ela mexerá apenas em questões pontuais em função dos conflitos que o tema gera entre os estados. Desoneração da folha de pagamento tende a ser a primeira importante medida s ser anunciada pela nova presidente.
Setor financeiro
O que ela diz: apoiará o Banco Central na adoção de regras mais claras e rígidas para os bancos, exigindo mais capital. A meta é limitar o excesso de alavancagem e a especulação desmedida. Também incentivará a criação de mecanismos de longo prazo para aumentar a poupança interna e incentivar os investimentos.
Como está hoje: no Brasil, as regras de segurança para o funcionamento dos bancos já são mais rígidos do que em várias partes do mundo. Mas há brechas, sobretudo nos mercados futuros, que permitem às instituições especularem com o real, criando distorções. São poucos os instrumentos de crédito de longo prazo.
O que espera do mercado: há uma preocupação quanto ao tamanho do BNDES. Há uma dependência do país em relação a instituição para o crédito de longo prazo e para os investimentos de infraestrutura. Caso o banco cresça ainda mais, poderá gerar um risco sistêmico para a economia. Especula-se também que Dilma imporá regras mais severas contra a especulação.
Agências reguladoras
O que ela diz: as agências reguladoras terão respaldo para atuar com determinação e autonomia, voltadas para a promoção da inovação, da concorrência e da efetividade do controle dos setores regulados.
Como está hoje: as agências foram rateadas entre os aliados da base do governo Lula. A politização está prejudicando os consumidores. Em vez de defenderem os interesses da população, os dirigentes apoiam as empresas, acreditando que depois de saírem das agências terão emprego nas companhias reguladas.
O que espera do mercado: espera que a presidente dê mais autonomia para as agências a fim de criar estabilidade jurídica e uma regulamentação clara para os setores controlados por esses órgãos. Recomenda o fim do preenchimento de cargos por políticos.
Funcionalismo
O que ela diz: a presidente eleita assegura que promoverá a valorização dos quadros da administração pública, independente de filiação partidária. Os servidores serão promovidos seguindo a meritocracia. Promoverá a qualificação do funcionalismo e dos serviços públicos.
Como está hoje: o governo Lula concedeu, nos últimos anos, grandes reajustes para uma série de carreiras, equiparando, em algumas delas, os ganhos aos da iniciativa privada. Mas a pressão continua. Há projetos no Congresso que, se aprovados ainda neste ano, custarão R$ 33,7 bilhões ao futuro governo.
O que espera do mercado: que a presidente eleita torne a administração pública mais eficaz e técnica, com poucas indicações políticas. Também se espera a desaceleração na expansão de despesas com a folha de salários e a redução dos cargos comissionados.
Inflação
O que ela diz: cuidará da economia com responsabilidade. O povo brasileiro não aceita mais a inflação como solução irresponsável para eventuais desequilíbrios. Ela reafirma o compromisso com a estabilidade da economia e das regras econômicas, dos contratos firmados e das conquistas estabelecida
Como está hoje: todas as projeções de inflação estão em alta, tanto para este ano quanto para 2011. As estimativas giram entre 5% e 5,5%, superando o centro da meta definida pelo governo. Mantido esse quadro, pressionado pelos gastos públicos, o BC terá que elevar a taxa básica de juros no ano que vem.
O que espera o mercado: a manutenção do sistema de metas de inflação, fundamental para a consolidação da estabilidade econômica. A perspectiva é de que, ao longo dos anos, Dilma reduza o objetivo (hoje, de 4,5%) perseguido pelo BC, abrindo espaço para a queda consistente das taxas de juros.
Pré-sal
O que ela diz: usará o fundo social do pré-sal para reduzir as desigualdades no país, melhorar a educação e o sistema de saúde. Promete erradicar a miséria que ainda envergonha o país e fortalecer os programas sociais, principalmente o Bolsa Família.
Como está hoje: o fundo social ainda depende de aprovação do Congresso. Muitas são as dúvidas quando a capacidade do governo de administrar os recursos oriundos do pré-sal.
O que espera o mercado: que a riqueza extraída do pré-sal seja realmente aplicada na redução das desigualdades do país. Os analistas temem que, propenso à gastança, o governo opte pelo desperdício e jogue pelo ralo a riqueza que poderia tirar pelo menos 30 milhões de família da pobreza absoluta.