O conjunto da economia brasileira se desacelerou significativamente a partir de abril, após o fim dos estímulos dados pela redução de impostos, mas o desempenho varia muito entre as regiões do país. A perda de fôlego do crescimento é menos acentuada no Nordeste e mais intensa no Sul e no Norte do país, enquanto o Sudeste fica no meio do caminho.
A importância do salário mínimo e do Bolsa Família na economia nordestina ajudam a explicar o bom desempenho na região, assim como o peso da indústria de alimentos e bebidas, que tem sido impulsionada pela evolução favorável da renda do trabalho e das políticas de transferência de renda do governo. No Sul, o peso da agropecuária e a indústria exportadora justificam o menor dinamismo da região. No Norte, a antecipação da produção de eletroeletrônicos para atender à demanda da Copa do Mundo fortaleceu a produção no primeiro trimestre, afetando o resultado posterior. Na região, porém, as vendas no varejo tiveram uma desaceleração menos acentuada que no resto do país.
O Índice de Atividade Econômica (IBC-Br) do Banco Central consolida, em um único indicador, a evolução mensal de agropecuária, indústria e serviços, mostrando grande aderência ao comportamento do Produto Interno Bruto (PIB). O dado nacional mostra uma economia, em março, funcionando a um ritmo 2,7% maior que o de dezembro. Depois dessa acelerada, o ritmo caiu e chegou a maio apenas 0,3% acima do resultado de março. O dado também é calculado por região e mostra que esse pequeno crescimento nacional foi composto por altas de 0,32% no Nordeste, 0,25% no Sudeste e 0,44% no Centro-Oeste, afetadas pelas quedas no Norte e no Sul, de 1,21% e de 0,4%, pela ordem.
Para a professora Tania Bacelar, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), o Nordeste tem se beneficiado muito do fato de o padrão do crescimento brasileiro nos últimos anos ter como um dos dos principais motores a expansão do consumo popular. No Nordeste, o peso das classes de menor renda é maior, lembra ela, ressaltando o grande impacto local do salário mínimo. "O Nordeste concentra 23% da população brasileira e 60% dos que recebem o mínimo."
Também ajuda a segurar a atividade econômica no Nordeste o desempenho da indústria de alimentos e bebidas, ressalta o economista Rogério César Souza, do Instituto de Estudos do Desenvolvimento Industrial (Iedi). Em maio, a produção do segmento cresceu 21,3% sobre igual mês de 2009. O setor de alimentos e bebidas é favorecido pelo bom desempenho dos rendimentos do trabalho e do aumento de renda decorrente do reajuste expressivo do salário mínimo e de transferências de programas, como o Bolsa Família, diz Souza.
Tania diz que o setor da construção civil também vai bem no Nordeste, com as obras do programa Minha Casa, Minha Vida e da transposição do rio São Francisco. Não por acaso, a produção de minerais não metálicos em maio cresceu 27,1% em relação ao mesmo período de 2009, por conta do aumento na fabricação de cimento e de ladrilho e placas de cerâmica para pavimentação. "Na comparação com o mês imediatamente anterior, a produção industrial no Nordeste cresce desde agosto de 2009, acumulando alta de 16,8% nesse intervalo", observa Souza.
De acordo com o economista Jorge Jatobá, da consultoria Ceplan, o fim do subsídio fiscal sobre os produtos da linha branca foi um dos principais responsáveis pelas vendas menores do varejo nordestino no segundo trimestre. Além disso, afirmou, está havendo um processo de acomodação do forte crescimento observado nos três primeiros meses do ano.
O economista Alexandre Rands, da consultoria Datamétrica, lembra que o Nordeste abriga um grande contingente de aposentados e beneficiários do Bolsa Família, o que garante uma demanda permanente para bens de consumo de massa, como alimentos, bebidas, calçados e têxteis. Esse seria o motivo pelo qual a indústria local, fortemente concentrada nesses itens, ainda roda em ritmo superior à média nacional.
O Ceará, por exemplo, que abriga um dos principais polos de calçados do país, ainda não registra desaceleração. Apesar de um pequeno recuo na atividade em maio, a indústria ainda operou em um ritmo superior ao de março.
O Índice de Atividade Econômica Regional do BC para a região Norte é o que mostrou a desaceleração mais forte no segundo trimestre. O nível do indicador em maio ficou 1,2% abaixo do registrado em março, na série com ajuste sazonal. O recuo, porém, ocorre após a alta forte nos primeiros meses do ano, o que elevou a base de comparação. De janeiro a abril, o setor de material eletrônico e aparelhos e equipamentos de comunicação, concentrado na Zona Franca de Manaus, crescia a um ritmo mensal superior a 50% em relação ao mesmo mês do ano passado, estimulada em boa parte por conta da fabricação de televisores, devido à proximidade da Copa do Mundo, como lembra Souza. Em maio, já houve desaceleração da alta do segmento nessa base de comparação, com aumento de 29,4% sobre maio de 2009 (não há série disponível com ajuste sazonal para essa série).
Nas vendas no varejo, a região Norte também registrou desaceleração no segundo trimestre, já que houve antecipação do consumo de bens como veículos e eletrodomésticos da linha branca no começo do ano, para aproveitar os impostos reduzidos. Mesmo assim, o resultado no Norte foi o melhor entre todas as cinco regiões, segundo números da Tendências Consultoria Integrada. Na média de abril e maio, o comércio da região cresceu 2,9% sobre o primeiro trimestre, uma base de comparação robusta, já que, de janeiro a março, houve alta de 9,8% sobre o trimestre anterior. O economista Adriano Pitoli, da Tendências, diz que a região passa por "transformações expressivas", com grandes obras de infraestrutura, como o gasoduto Urucu-Manaus, inaugurado em novembro, e a perspectiva de construção de hidrelétricas, fatores que impulsionam a renda da região.
O segundo trimestre também não foi dos melhores para o Sul. Em maio, o índice do BC para a região ficou 0,4% abaixo do nível de março, na série com ajuste. Tania lembra que a agropecuária tem peso expressivo no Sul e observa que o segmento não tem mostrado grande dinamismo. No cálculo da Tendências, as vendas no varejo no Sul no bimestre abril-maio caíram 1,2% em relação ao nível do primeiro trimestre. (Colaborou Murillo Camarotto, do Recife)
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