31/05/2010 VALOR ECONÔMICO
A performance fiscal do governo federal no primeiro quadrimestre - superávit primário de 2,3% do Produto Interno Bruto - foi um importante indicativo de que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, pretende mesmo honrar o compromisso de encerrar o último ano de mandato do presidente Lula tendo cumprido a meta de saldo primário de 3,3% do PIB. Com tal desempenho, será possível reduzir a dívida líquida do setor público para 40% do PIB, depois de ela ter chegado a 42,8% do PIB no ano passado.
Segundo os dados do governo central até abril, divulgados pelo Tesouro Nacional, o crescimento das receitas de impostos e contribuições, inclusive da previdência social, tem sido excepcional: aumento de 18,3%, ou seja, de 6,5% sobre o crescimento nominal do PIB. Só em abril a receita bruta do Tesouro cresceu 33,8%, chegando a R$ 62, 6 bilhões em comparação aos R$ 46,8 bilhões de março, reforçada sobretudo pelo Imposto de Renda das pessoas físicas e jurídicas, por R$ 2,9 bilhões de dividendos recebidos das empresas estatais e pelo aumento das arrecadações da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e da Cofins. O impulso na arrecadação decorre da forte retomada do nível da atividade econômica.
As despesas, ainda assim, conseguiram superar o ritmo de aumento das receitas. Entre janeiro e abril, o gasto público do governo federal (que inclui a previdência social e o Banco Central) teve uma elevação de 18,5%, ou 6,7% sobre a variação nominal do PIB, que foi de 11,1% no período sobre os mesmos meses do ano anterior (quando o produto foi negativo).
Em valores nominais, gastou-se R$ 21,5 bilhões a mais neste quadrimestre em relação a idêntico período de 2009. Destes, R$ 3,6 bilhões representaram aumento da folha de salários e R$ 17,9 bilhões foram com despesas de custeio e capital. Com o vigoroso crescimento econômico, porém, a folha de pessoal que no primeiro quadrimestre de 2009 equivalia a 5,7% do PIB, caiu para 4,98% do PIB em igual período deste ano.
Boa notícia foi a elevação dos investimentos. Entre janeiro e abril, o aumento de R$ 6 bilhões no gasto com investimentos representou um acréscimo de 89% sobre o contabilizado no ano passado. Os investimentos totais chegaram, assim, a R$ 12,8 bilhões. Apesar de ser uma reação substancial, movida pelos restos a pagar do ano passado, o valor nominal dos investimentos no orçamento ainda é muito baixo.
O governo está entusiasmado com a recuperação da arrecadação de tributos depois das dificuldades do pós crise global, quando teve que reduzir a meta de superávit. Nada como um vigoroso nível de atividade para consertar todos os problemas.
Os ciclos econômicos, contudo, recomendam prudência. A história mostra que os anos de prosperidade não são eternos e a política fiscal dos governos deve ser cautelosa para atenuar os picos e vales das receitas públicas.
Assim como a sociedade entendeu que em 2009, por toda a ação de estímulo à atividade produtiva para evitar uma recessão mais duradoura, era concebível o governo relaxar na produção do superávit primário, agora considera que o momento é de poupar.
Se as receitas públicas prosseguirem em acentuado crescimento - como se prognostica no Ministério da Fazenda - caberá ao ministro Guido Mantega defender que a política anticíclica que deu fôlego à economia no ano passado, seja aplicada também neste ano. Ele poderá fazer isso aumentando a meta de superávit primário para além dos 3,3% do PIB ou mesmo apartando um pedaço da arrecadação para capitalizar o Fundo Soberano.
Esse fundo, aliás, foi criado exatamente para isso: ser uma poupança formada nos períodos de vacas gordas para poder financiar os dispêndios nos tempos de vacas magras.
Além dessa ser uma forma de gestão fiscal previdente, ela será de grande valia para ajudar a desaquecer um pouco o fervor do crescimento. O ritmo de aumento do PIB detectado pelo Banco Central, de quase 10% no primeiro trimestre, está muito acima do que se considera sustentável para manter a inflação sob controle (algo ao redor de 5% a 6%). Um reforço da meta pode evitar que o Banco Central tenha que estender por mais tempo do que o imaginado o ciclo de aperto monetário.