06/04/2009 ZERO HORA
Eventos inéditos podem demandar medidas igualmente novas e, quem sabe, surpreender em resultados. É o que parece ocorrer com a decisão do governo de abrir mão de parte da receita obtida com tributação para combater o recuo da economia.
No caso dos automóveis, a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), iniciada no final do ano passado, mostrou-se vantajosa para os cofres públicos. Conforme estudo da Anfavea, entidade que reúne as montadoras, os carros produzidos entre 20 de dezembro do ano passado e 13 de março geraram tributos suficientes para alta de 10% da receita sobre o valor que teria sido alcançado caso a isenção do IPI não fosse implementada.
Esse resultado, segundo a Anfavea, ocorreu apesar de a arrecadação do IPI ter perdido R$ 592 milhões no período. No final, a receita gerada foi de R$ 6,06 bilhões, acima dos R$ 5,49 bilhões que seriam recolhidos com o IPI cheio. A compensação, mostra o estudo, veio do aumento de receita com outros impostos já que a redução do IPI barateou os preços dos veículos e estimulou as vendas, depois do tombo de cerca de 30% registrado pelas montadoras em novembro.
– Os consumidores compraram carros, mas a queda do IPI foi um dos pilares que sustentaram as vendas junto com crédito mais vantajoso e promoções – diz Gilberto Luiz do Amaral, presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT).
Embora a Receita Federal informe que os primeiros resultados do impacto da redução do IPI para veículos serão demonstrados na arrecadação de março, ainda não divulgada, a experiência estimulou não só o governo a prorrogá-la como a ampliá-la para motocicletas e construção civil. Especialistas avaliam que o alívio poderia ser estendido sem grandes sobressaltos a outros setores. Amaral observa que o fim da CPMF, o imposto sobre o cheque, não provocou o cataclisma anunciado pelos que defendiam sua manutenção, embora lembre que a economia estava em crescimento. Para o professor da Faculdade de Informática e Administração Paulista Marcos Crivelaro, ante a impossibilidade de uma reforma tributária e pressionado pela retração global, o governo optou por medidas pontuais, numa aposta de que a reação do consumo doméstico será suficiente para compensar perdas com desonerações:
–Não adianta ganhar muito vindo de poucos. (O governo) pode recolher menos tributos, mas ganha com o aumento do ICMS, do Imposto de Renda, além de manter girando a roda da economia.
Para um dos maiores especialistas em contas públicas do país Raul Velloso, as desonerações são um teste, uma vez que darão certo se aumentarem a atividade econômica. A dificuldade em medir os efeitos do alívio tributário está na impossibilidade de calcular impactos indiretos, além da incerteza pela crise mundial. Amaral, do IBPT, reforça dizendo que a correção da tabela do IR não implicou perda de arrecadação, mas, pergunta: quanto do crescimento da receita veio do aumento da formalização do emprego? Velloso pondera:
– Se a compensação fosse total, não haveria tanta relutância em abrir mão de tributos. (5/5)
lucia.ritzel@zerohora.com.br