22/01/2010 JORNAL DO COMÉRCIO
Histórico de déficit no Estado ajudou secretaria a consolidar papel destacado
Paula Coutinho
Estratégica para qualquer governo, a Secretaria da Fazenda (Sefaz) adquiriu no Rio Grande do Sul - devido ao quadro estrutural de dificuldade nas finanças - uma importância ainda maior nos rumos da gestão. "Em uma circunstância histórica de déficit, o papel do órgão que comanda essa política ganha mais relevância por razões óbvias", avalia o ex-secretário da Fazenda do governo Antônio Britto (1995-1998) Cézar Busatto (PMDB). Por conta deste contexto, o ex-secretário estadual do Planejamento dos governos Britto e Germano Rigotto (2003-2006) João Carlos Brum Torres (PMDB) observa a influência da Sefaz na condução das finanças estaduais. "Todas as últimas gestões têm mantido a mesma linha. Há uma política de ajuste que foi seguida independentemente dos governos", conclui. O secretário da Fazenda, Ricardo Englert, entende que o diferencial do governo Yeda Crusius (PSDB) foi priorizar o zeramento do déficit. "Começamos a trabalhar muito mais focados no déficit zero. Fizemos isso com uma ênfase maior porque as fontes de financiamento haviam praticamente se esgotado", explica. Englert lembra que o desafio era adaptar o orçamento à capacidade financeira do Estado. "A Fazenda atuou como coordenadora do processo, mas contou com o apoio das outras pastas. Houve uma proximidade maior da Sefaz com os outros órgãos. Criamos uma massa crítica no Estado no sentido de controlar custos e ser mais eficiente", afirmou. Secretário do governo Britto, Busatto atribui o sucesso da busca pelo ajuste fiscal à adoção de um planejamento estratégico na Sefaz, que, segundo ele, começou a ser implementado em 1996. "Mais do que o papel de um ou outro secretário, o equilíbrio é fruto da persistente aplicação das metas. O ajuste se alcançou mesmo com a alteração de governo", afirma. Para Busatto, o planejamento foi essencial para a concretização de uma política de Estado. "Essa visão, que se consolidou na Fazenda, é o elemento-chave da política de ajuste fiscal. Se governa por metas, se avalia permanentemente os resultados e se tem o comprometimento coletivo da equipe." A continuidade de um planejamento global a longo e médio prazo também é destacada por Pedro Gabril, diretor da Contadoria e Auditoria-Geral do Estado (Cage) no governo Rigotto. Quadro da Sefaz desde 1986, Gabril conta que a primeira vez que ouviu falar em planejamento foi com o então secretário da Fazenda, Paulo Michelucci, que assumiu a titularidade no final do governo Britto e depois voltou a comandar a pasta no governo Rigotto. "(A gestão das finanças) é uma continuidade de estratégias. Não é porque mudou o governo que começa tudo do zero. Inclusive a negociação do empréstimo do Banco Mundial (concretizado na gestão Yeda Crusius), não começou nesse governo", ressalta. O vice-presidente do Sindicato dos Auditores de Finanças Públicas do Rio Grande do Sul (Sindaf), Celso Malhani, é do quadro da Sefaz há 13 anos. Relata que desde então já estavam em curso a reestruturação e o reaparelhamento da Secretaria da Fazenda. Ele concorda que o processo realizado de forma contínua e evolutiva acabou refletindo na conquista do equilíbrio das contas públicas. O dirigente da entidade ressalta que o papel da Sefaz é fundamental, independentemente de o Estado viver período de déficit zero ou não. "É preciso administrar na escassez ou na fartura. A Sefaz, de acordo com as prioridades do governo, é o maestro desses recursos", afirma Malhani. Na mesma linha, Pedro Gabril completa: "Se o Estado fosse um corpo humano, a Sefaz seria o coração, que irriga todos os outros órgãos". A Secretaria da Fazenda (Sefaz) é tida como um dos órgãos estaduais com melhor e mais qualificado corpo técnico. Ao contrário do que costuma acontecer em outras pastas, a grande maioria dos servidores é de carreira, havendo poucos cargos em confiança (CCs). Por norma, todas as chefias de divisão e de departamento são ocupadas por servidores do quadro efetivo. Isso garante a profissionalização e evita a descontinuidade que ocorre por conta da alternância dos chefes do Executivo a cada eleição. A governadora do Rio Grande do Sul, Yeda Crusius (PSDB), escolheu o economista Aod Cunha, doutor pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, para o desafio de zerar o déficit do Estado. Reconhecido pela capacidade eminentemente técnica, Aod conquistou destaque no Executivo. Deixou o governo em 2008, por vontade própria, alegando a necessidade de tratar de assuntos particulares. Contatado pela reportagem, o ex-secretário, que assumiu, neste mês, como consultor da empresa de planos de saúde Unimed, informou que não concede mais entrevistas sobre política. Depois de Aod, entrou em cena Ricardo Englert, que é do quadro funcional do Banrisul, mas, há pelo menos 12 anos, vem atuando na Secretaria da Fazenda. Essa também é uma prática frequente: destacar para a função de titular da pasta algum servidor da casa. Foi na Fazenda que a governadora Yeda buscou pelo menos outros dois expoentes do Executivo estadual: o secretário do Planejamento e Gestão, Mateus Bandeira, e a secretária-geral de Governo, Ana Pellini, que, antes de assumir a pasta no lugar de Erik Camarano, presidiu a Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam). Tanto Englert, quanto Bandeira e Ana Pellini ocuparam cargos-chaves em mais de um governo no Rio Grande do Sul. Englert foi secretário-adjunto de Cézar Busatto (Fazenda), no governo Antônio Britto (1995-1998). No governo Germano Rigotto (2003-2006), foi diretor do Banrisul. Bandeira transitou pelo governo petista de Olívio Dutra (1999-2002), no qual foi assessor técnico da presidência da CEEE. Também atuou na equipe do Ministério da Fazenda, durante parte da gestão de Antonio Palocci (PT), no primeiro mandato do governo Lula. Ana Pellini, no governo Britto, trabalhou junto ao gabinete do secretário da Fazenda, Cézar Busatto. Na gestão Rigotto, foi diretora-geral da Secretaria da Segurança Pública. Também saíram dos quadros da Fazenda a secretária-adjunta da Justiça, Dora Saikoski, o secretário-adjunto do Desenvolvimento, Josué Barbosa, e o presidente do Detran, Sérgio Filomena. Atualmente, 104 servidores da Sefaz estão cedidos a outros órgãos do Estado. No governo de Germano Rigotto, o dono da chave do cofre do Estado era Paulo Michelucci, que também atuou como secretário da Fazenda no final da gestão Antônio Britto. Servidor de carreira desde que passou no concurso para fiscal de ICMS, Michelucci ocupou vários cargos de diretoria na área da Fazenda. No governo Rigotto, uma das bandeiras era o pacto federativo, com a proposta de reforma e ajuste das desigualdades tributárias. Discreto, Michelucci comandou a pasta durante quase toda a gestão Rigotto, até ser deslocado para a chefia da Casa Civil. No governo Olívio Dutra, o homem forte da Fazenda era Arno Augustin, hoje secretário do Tesouro Nacional. A trajetória de destaque começou na primeira gestão do PT na prefeitura de Porto Alegre (1989-1993), assumindo a Secretaria Municipal da Fazenda por seis anos. No início do governo Lula (2003-2006), Augustin trabalhou com o ministro Antonio Palocci como secretário-executivo-adjunto da Fazenda. Na gestão de Antônio Britto, a Secretaria da Fazenda era comandada por Cézar Busatto, agente fiscal do Tesouro do Estado.Sefaz fornece quadros para o primeiro escalão
Servidores de carreira também comandaram finanças públicas nas gestões de Britto, Olívio e Rigotto