18/01/2010 VALOR ECONÔMICO
Quando um paciente depende de aparelhos para ser mantido vivo, geralmente não é aconselhável apertar o tubo de oxigênio. Mas isso será exatamente o que as autoridades europeias poderão ser obrigadas a fazer. A economia da região encolheu 4,1% no ano passado, e estima-se que crescerá apenas 0,7% em 2010, à medida que os gastos dos pacotes de estímulo surtirem efeito. Com o aumento do endividamento dos governos e com Grécia e Irlanda flertando com o calote, porém, líderes de toda a Europa poderão precisar cortar parte desse oxigênio, correndo o risco de causar uma recaída na recessão. "Se os cortes vierem rápido demais, eles poderão sufocar a recuperação", diz Jamie Dannhauser, economista na consultoria Lombard Street Research.
A dívida total como percentual do PIB na União Europeia (UE) - um importante indicador do vigor fiscal - dará um salto para quase 80% neste ano, de acordo com a Comissão Europeia (CE). Apesar de essa cifra distar dos 89% devidos por um EUA esbanjador, representa uma alta ante os 60% de 2007. Para este ano, os déficits combinados dos governos europeus atingirão 6,7% do PIB, mais que o dobro dos 3% exigidos pelas normas da UE. Na Grécia, Reino Unido, Letônia e Espanha, o déficit de 2010 está na casa dos dois dígitos.
É preciso aumentar impostos, reduzir grandes projetos de infraestrutura e diminuir a remuneração dos servidores para que a dívida seja reduzida. Mas muitos especialistas reclamam que os governos podem estar se mexendo rápido demais. "Um equilíbrio precisa ser alcançado entre uma recuperação relativamente fraca e níveis de dívida ascendentes", diz Sebastian Barnes, economista sênior na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), em Paris. "Alguns países se veem em posições extremamente difíceis".
Isso é especialmente verdade para o grupo chamado Piigs: Portugal, Itália, Irlanda, Grécia e Espanha. Temores de calote estimularam as agências de classificação de crédito internacionais a rebaixar as suas dívidas soberanas, encarecendo a captação de dinheiro desses países. "A incerteza é veneno para a confiança do mercado", diz Alistair Milne, professor de Finanças na Escola de Administração de Empresas Cass em Londres.
A Irlanda, onde o mercado habitacional encolheu 20% no ano passado e a economia teve contração de 7,5%, cortou drasticamente US$ 5,8 bilhões do seu orçamento de US$ 87 bilhões de 2010. Isso inclui subsídio mais baixo para seguro-desemprego, subsídios reduzidos para pais de crianças pequenas e cortes de remuneração de 5% a 15% para funcionários do governo.
A Grécia planeja economizar até US$ 6,5 bilhões congelando o salário do funcionalismo público, aumentando impostos sobre imóveis de luxo e elevando tributos que incidem sobre cigarros e bebidas alcoólicas em 20%.
A França pretende levantar US$ 4,4 bilhões anuais cobrando US$ 25 por tonelada métrica de dióxido de carbono emitido por carros, calefação residencial e fábricas, com um imposto verde.
O Reino Unido provavelmente aumentará a idade de aposentadoria no país e cortará programas previdenciários, apesar de que nada deverá acontecer antes de uma eleição nacional que será realizada em meados do ano.
A irritação crescente do eleitorado poderá moderar os planos dos políticos. Greves são planejadas na Grécia, trabalhadores na Espanha rechaçaram um seguro-desemprego menor e eleitores irlandeses foram às ruas para protestar contra os cortes.
"Fora vender os nossos fígados, não sabemos como faremos para pagar as nossas contas", diz i irlandês Brian Condra, 38 anos, faxineiro num hospital e pai de três filhos da cidade litorânea de Drogheda. Ele estima que o salário líquido da sua família sofra queda de cerca de US$ 360 mensais, sem contar US$ 500 em novos impostos criados no ano passado. "Andei por aí nos últimos quatro meses precisando de sapatos novos", disse Condra. Agora "precisarei sair por aí descalço".
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