30/11/2009 ZERO HORA
Poderia ser apenas mais um flagrante de corrupção, mas a presença do governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda (DEM), recebendo dinheiro em um vídeo que integra o inquérito da Operação Caixa de Pandora, da Polícia Federal (PF), coloca o episódio, que vem sendo chamado de “mensalão do DEM”, em outro patamar. O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Cezar Britto, definiu as imagens como “devastadoras”.
A contundência das gravações, produzidas pelo então secretário de Relações Institucionais do DF, Durval Barbosa, levou a OAB a articular um pedido de impeachment de Arruda. Britto se reunirá hoje com representantes da seccional da Ordem no DF, que já formulou o pedido de afastamento. No encontro, a OAB nacional decide se adere à proposta.
– Trata-se da capital do país. Pode haver sim uma ação conjugada, até para mostrar unidade – afirmou Britto.
A Caixa de Pandora investiga pagamento de propina a aliados do governo Arruda na Câmara Legislativa. Na sexta-feira, a ação da PF deu publicidade ao processo, ao cumprir mandados de busca e apreensão no DF, Goiás e Minas Gerais. No sábado, a série de vídeos produzida com a ajuda de Durval começou a dar contornos definidos ao escândalo do Planalto Central. Seriam mais de 30 registros de imagens repassados pelo ex-secretário, interessado em um acordo de delação premiada que atenue sua participação no esquema de corrupção.
Há nas imagens, além do flagrante em que Arruda recebe dinheiro, outras cenas envolvendo Durval, o governador e o chefe da Casa Civil, José Geraldo Maciel. Na noite de ontem, um novo flagrante surgiu: o presidente da Câmara Legislativa, Leonardo Prudente (DEM), recebe maços de dinheiro das mãos de Durval. Para acondicionar a propina, Prudente emprega todos os bolsos do paletó – e até mesmo o interior de suas meias (leia na página 8).
Em nota, Arruda e seu vice, Paulo Octávio (DEM), também citado como beneficiário do esquema, negaram as acusações. Os dois se disseram “perplexos’’ com as denúncias e afirmaram que Durval agiu de forma “capciosa e premeditada’’.
ZERO.HORA.COM |
Vídeo mostra José Roberto Arruda recebendo dinheiro. |
Gravações comprometedoras |
Imagens de uma câmera escondida mostram o governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda (DEM), recebendo R$ 50 mil em notas de R$ 100 das mãos do então presidente da Companhia de Desenvolvimento do Planalto (Codeplan), Durval Barbosa. As imagens seriam de 2005, quando Arruda era deputado federal e aliado do governador Joaquim Roriz. Esta e outras gravações foram feitas por Durval, que foi tesoureiro da campanha de Arruda em 2006, e depois secretário de Relações Institucionais. |
Durval – Deixa eu pegar um negócio aqui antes que eu me esqueça. |
(Durval se levanta do sofá e logo retorna com o dinheiro, que entrega a Arruda) |
Durval – Você lembra disso aqui? |
Arruda – Ah! Ótimo. Você podia me dar uma cesta, um negócio aqui. |
(Durval se levanta e vai até a sua mesa enquanto o governador prossegue.) |
Arruda – Eu tô achando que você podia passar lá em casa, porque descer com isso aqui é ruim. |
Durval – Por quê? Não tem ... (trecho ininteligível) |
(Durval coloca o dinheiro dentro de um envelope pardo.) |
Arruda discute, segundo a PF, com o seu chefe da Casa Civil, José Geraldo Maciel, sobre a “despesa mensal com político”. Ele orienta o secretário a unificar os pagamentos a aliados, que teriam se desorganizado, aparentemente, com a saída de Domingos Lamoglia de sua chefia de gabinete. |
Arruda – Aquela despesa mensal com político sua hoje está em quanto? |
José Geraldo – Tá aqui a listinha. |
Durval Barbosa – Ué, ele não tem que unificar? |
José Geraldo – Seiscentos é aquilo que sobra. |
Arruda – Mas unificou tudo? |
(Arruda demonstra irritação ao ouvir que não há um controle do pagamento) |
Arruda – Pois é, mas unificar é isso, não poder achar ninguém... é saber tudo! Nos temos que saber de um por um. |
José Geraldo – Tá. |
Arruda – Se ele não vai pegar com o Domingos (Lamoglia, ex-chefe da gabinete) ele vai pegar com quem? |
Diálogo entre o então secretário de Relações Institucionais, Durval Barbosa, e o chefe da Casa Civil, José Geraldo Maciel, trata do rateio da propina: |
Durval – Eu, na sexta-feira, já passo o dele, do Arruda. Já passo o do Arruda inteiro, tá? Aí, fica faltando só umas merrecas. Porque merreca é na hora. |
José Geraldo – Só pra eu ter uma ideia, sabe mais ou menos quanto vai ser? Porque quero ver se eu faço um negócio. |
Durval – Dá uns 50 pra cada um. É por aí. |
O CAMINHO DA PROPINA NO CERRADO |
De acordo com inquérito da Polícia Federal (PF), R$ 600 mil teriam sido arrecadados mensalmente para posterior distribuição entre políticos do DF – aliados do governador José Roberto Arruda (DEM): |
A GÊNESE DO ESQUEMA |
- O pagamento de propina, nos moldes atuais, teria tido origem no governo anterior, de Joaquim Roriz (ex-PMDB, atual PSC). A corrupção teria passado pelas mãos de Domingos Lamoglia – que foi chefe de gabinete de Arruda no governo distrital e hoje integra o Tribunal de Contas do Distrito Federal, segundo a PF. |
O PERSONAGEM |
- Durval Barbosa – secretário de Relações Institucionais do DF, demitido por Arruda ainda na sexta-feira. Delegado aposentado e economista, teria atuado para Roriz e Arruda como caixa de campanha, cobrador, arrecadador e distribuidor de propinas nos dois governos. |
QUEM DEU O DINHEIRO |
- Empresas privadas que negociam com o governo do DF. |
- No inquérito, há indícios de que uma dessas empresas repassou R$ 34 mil a Durval após um reconhecimento de crédito no valor de R$ 34 milhões por parte do governo do DF. |
- O secretário de Educação, José Luiz Valente, teria recebido R$ 60 mil de outra empresa. |
O OBJETIVO DA PROPINA |
- Vantagens junto ao governo do DF. |
A PARTICIPAÇÃO DO GOVERNADOR |
- À PF, Durval disse que Arruda recebia remessas de dinheiro periodicamente, de 15 em 15 dias. Ao intermediar os repasses para os aliados, Arruda tomava uma parte para si “para suas despesas pessoais”. Em vídeo que integra o inquérito, o governador foi flagrado recebendo R$ 50 mil. |
- Outro suposto beneficiado pelo esquema é o vice-governador Paulo Octávio (DEM). Em vídeos que integram o inquérito, Marcelo Carvalho, diretor do grupo empresarial Paulo Octávio, é flagrado recebendo cota de 30% que caberia ao vice. |
QUEM TERIA RECEBIDO O DINHEIRO |
- Deputados aliados. Os nomes não foram oficialmente divulgados. Em um vídeo, Durval aparece providenciando suposto pagamento de propina ao presidente da Câmara Legislativa, Leonardo Prudente (DEM), Eurides Brito (PMDB), Junior Brunelli (PSC), Odilon Aires (PMDB) e Benício Tavares (PMDB). |
- Teriam recebido propina ainda o chefe de gabinete do governador, Fábio Simão, e o assessor de imprensa Omézio Pontes. |