27/10/2009 CORREIO BRAZILIENSE
Acontece com o Estado o mesmo que com as pessoas. Quando gasta mais do que ganha, entra no vermelho. Para sair do aperto, há três saídas. Uma delas: aumentar a receita. Outra: cortar despesas. A última mas não menos importante: associar as duas. O governo federal optou pela primeira, mas escolheu vias transversas. Para engordar o caixa, recorre a artimanhas fiscais. Em bom português: lança mão do dinheiro que não lhe pertence para manter a gastança pouco cuidadosa.
O cenário é preocupante. A crise global obrigou o Executivo a tomar medidas necessárias para impedir que o país caísse em recessão. Entre elas, renunciou ao Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) incidente sobre as vendas da indústria automobilística e da linha branca. Acertou. O Brasil figura entre os primeiros países a tirar o pé do atoleiro e acena com a possibilidade de crescimento de 5% a 7% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2010.
Ora, o Estado não planta dinheiro. Arrecada recursos da sociedade e, com o montante, faz frente às despesas, muitas das quais inadiáveis e engessadas. As sucessivas quedas da receita exigem respostas. O governo, em vez de apertar o cinto, recorre a medidas duvidosas. Há pouco anunciou que retardaria a devolução do Imposto de Renda. Ante a grita generalizada, voltou atrás. Mas não desistiu de buscar brechas capazes de lhe ampliar as margens de gasto.
Atuou em três frentes. Uma: apelou para artimanhas fiscais. Entre elas, a transferência de depósitos judiciais tributários e não tributários para o Tesouro. Essa e outras iniciativas ligadas ao PAC e ao Minha Casa, Minha Vida asseguraram o espaço de manobra em R$ 54,6 bilhões. Outra: lançou mão de ardis nas despesas, como congelamento da liberação das emendas parlamentares e da proposição dos pedidos de abertura de créditos suplementares ou adicionais ao Orçamento. Conseguiu, com isso, R$ 34 bilhões.
A terceira frente é conhecida por todos: aumento de impostos. Tanto que outro naco (R$ 4 bilhões por ano) virá do IOF de 2% sobre o capital estrangeiro que entrar no país em aplicações na bolsa de valores ou em renda fixa. Os fatos indicam que a taxação não servirá para evitar a queda do dólar como o Ministério da Fazenda apregoa.
O caminho adotado pelo governo apenas lança dúvidas sobre sua capacidade de gerir as contas públicas como “alguém” que pretende gastar melhor e não apenas gastar mais. O ideal, para garantir confiabilidade, não é aumentar impostos ou conseguir verbas por meio de artifícios arrecadatórios, mas gerenciar bem as despesas e investimentos governamentais, combatendo a corrupção e garantindo canais para que o dinheiro público chegue ao destino sem paradas predatórias na tramitação.