26/10/2009 O ESTADO DE S. PAULO
O Brasil deve "rever sua política fiscal" se a recuperação continuar robusta e a taxa de câmbio seguir se valorizando. Esse é o alerta de Nicolás Eyzaguirre, diretor do Departamento do Hemisfério Ocidental do Fundo Monetário Internacional (FMI).
"Não há problemas de sustentabilidade fiscal no Brasil, mas, se o capital estrangeiro continuar entrando rapidamente e a recuperação estiver estabelecida, o governo pode querer rever a política fiscal", disse Eyzaguirre, em resposta à pergunta do Estado.
Segundo ele, o IOF de 2% sobre aplicações estrangeiras em títulos e bolsa "não vai adiantar quase nada se o governo mantiver o estímulo fiscal e as taxas de juros altas". "É preciso brecar por meio de política fiscal", acrescentou. Eyzaguirre conversou com jornalistas em Washington antes de embarcar para São Paulo, onde lançou ontem o relatório Panorama Econômico Regional (Regional Economic Outlook) do FMI.
Perguntado sobre a situação fiscal do Brasil, se a redução do superávit primário e aumento de gastos preocupam o FMI, Eyzaguirre afirmou que o Fundo não vê "a situação fiscal no Brasil como insustentável". "Dito isso, porém, como a economia americana provavelmente continuará enfraquecida e a do Brasil deverá continuar indo bem, a previsão é que mais capital entre no País e continue a valorizar a moeda. Será o problema clássico de crescimento com taxa de câmbio forte demais", disse o economista.
"E o que ajuda nesse caso é ser mais leniente com a política monetária, em vez de manter política fiscal mais frouxa." Eyzaguirre afirmou que, quanto mais expansionista a política fiscal, maiores serão as taxas de juros o que deve atrair mais capital estrangeiro, valorizando a moeda. "É preciso brecar por meio de política fiscal." Ele afirmou que é mais difícil formular política fiscal quando há confiança de menos, ou demais.
Com a adoção do IOF de 2% sobre aplicações estrangeiras em títulos e bolsa, o governo "pode se ver tentado a adiar outros ajustes necessários". "Esse imposto pode dar algum espaço para desacelerar os fluxos de capital e a valorização da moeda, mas não é muito; não substitui ajustes fundamentais, dá uma proteção pequena que desaparece com o tempo."
A opção, segundo ele, "é não estimular a economia demais com política fiscal". "Aí pode reduzir as taxas de juros o que deve tornar o país menos interessante para o capital estrangeiro", disse. "Além disso, é preciso aumentar a produtividade para manter o setor exportador lucrativo, apesar da taxa de câmbio valorizada." Eyzaguirre fala com conhecimento de causa - ele trabalhava no Banco Central do Chile quando o país adotou controles de capital, nos anos 90. O Chile cobrava uma taxa na entrada, quando era preciso depositar o equivalente a 30% da aplicação, reembolsáveis somente depois de um ano.
O PREÇO DA CRISE
Eyzaguirre apresentou o relatório do FMI sobre a América Latina. O documento destaca que crise global custará mais de US$ 150 bilhões à região. Segundo o Fundo, o pior da crise ficou para trás na maioria dos países da América Latina e do Caribe. O FMI alerta , no entanto, que a fraqueza da economia americana vai afetar a recuperação em algumas nações.
O fraco consumo privado e os níveis muito mais altos de endividamento dos EUA podem, no entanto, pesar na região. Isso seria um problema em especial para México e Caribe, que têm mercados intimamente ligados aos Estados Unidos.