20/10/2009 VALOR ECONÔMICO
Antonio Delfim Netto*
Não só porque os holofotes estão apontados para o Brasil, nenhum de nós pode deixar de se preocupar com os problemas ambientais e com o bom uso que fazemos da terra para produzir alimentos e dos nossos recursos naturais para a geração de energia. Na realidade são aspectos de uma só questão, a de como realizar o desenvolvimento sustentado sem agredir os princípios conservacionistas de domínio universal.
Com alguma tolerância podemos digerir as manifestações de ignorância do mundo exterior quanto à nossa geografia e à formação política. Nós, brasileiros, não podemos esquecer que somos um continente e um país federal. A história mostra que as tentativas de centralização do poder terminaram com a reação (às vezes armada) das unidades provinciais e depois estaduais, em geral para restabelecer alguma atividade regulatória e a liberdade tributária.
Apesar dos inúmeros entreveros, recusamos as evidências e ainda hoje continuamos a cuidar daquelas questões fundamentais (inclusive envolvendo tributação) como se a federação não existisse. O projeto de reforma tributária que está no Congresso, por exemplo, insiste em pensar o Brasil como um país unitário. Trata-se de uma enorme perda de tempo, uma tentativa destinada ao fracasso, tamanha a resistência dos Estados e municípios.
Em nenhum setor da vida nacional, no entanto, as iniciativas de centralização têm produzido maior dano do que na regulação das atividades agrícolas. De Brasília, burocratas de competência duvidosa e graves desvios ideológicos redigem um monte de sandices impondo aos agricultores "índices de produtividade mínima" sem distinguir as características geográficas ou as culturas locais. Ignorando que estão lidando com a agricultura mais eficiente do planeta, sentem-se autorizados a interferir na organização da atividade agrícola de Estados e municípios em nome de problemas ambientais e de produtividade, que igualmente desconhecem!
Por enquanto, só um Estado (Santa Catarina) reagiu, produzindo um estatuto de proteção ao meio ambiente adequado às particularidades de seu território, prerrogativa que está agora em discussão no Supremo Tribunal Federal. Deve-se saudar a resistência do governador Luís Henrique ao defender uma legislação que (sem violar os princípios conservacionistas universais) leva em conta a história, as tradições, a geografia e os próprios índices de eficiência econômica da atividade agropecuária em seu Estado. O fato é que a sociedade catarinense já se pronunciou contra a aceitação dos tais "índices de produtividade mínima" e demonstra disposição de impedir na prática a sua aplicação, antes da manifestação da mais alta Corte do país.
Governadores dos demais Estados e prefeitos de todo o Brasil deveriam estar se mobilizando para estimular o Congresso Nacional a, soberanamente, devolver um mínimo de liberdade às unidades federativas, ofuscadas pelo centralismo míope da Constituição de 1988, para que cada uma possa utilizar com maior vigor e inteligência sua capacidade de crescimento e de harmonização com o meio ambiente.