Nas páginas da ação por improbidade administrativa que o MPF move contra a governadora Yeda Crusius, a participação dela e dos outros oito réus é descrita com base em testemunhos, diálogos gravados com autorização judicial e depoimentos por escrito
Das 1.238 páginas da ação civil pública do Ministério Público Federal (MPF), 1.046 – mais de 80% do conteúdo total – são de transcrições de conversas gravadas. A partir delas, os procuradores sustentam a tese de que nove réus, incluindo a governadora Yeda Crusius, participaram ativamente do desvio de R$ 44 milhões do Departamento Estadual de Trânsito (Detran), revelado pela Operação Rodin, em novembro de 2007.
Interceptações telefônicas, algumas inéditas, entre envolvidos na fraude que são réus no processo criminal da Operação Rodin e conversas gravadas entre o consultor Lair Ferst e o ex-representante do Estado em Brasília Marcelo Cavalcante, que morreu em fevereiro, estão entre os principais elementos de prova apresentados.
A íntegra da ação foi divulgada às 14h3min de ontem no blog do jornalista Políbio Braga, que tratou de desmerecer o conteúdo, em sintonia com as manifestações de advogados como Fábio Medina, que defende a governadora, e Norberto Flach, que representa o ex-secretário-geral de Governo Delson Martini e a assessora de Yeda Walna Meneses. “A montanha pariu um rato”, escreveu Políbio, repetindo uma frase usada desde sábado por Flach.
Na ação, consta que o deputado federal José Otávio Germano (PP) é um dos principais mentores e beneficiários do “megaesquema”. Conforme os procuradores da República, o valor de propina era fixado em R$ 450 mil mensais. Parte se destinava ao pagamento do chamado “jurídico”, sendo que R$ 70 mil ficavam com José Otávio. Pelo menos R$ 30 mil eram recebidos pelo presidente do Tribunal de Contas do Estado (TCE), João Luiz Vargas. O restante – R$ 350 mil – eram divididos em duas parcelas de cerca de R$ 175 mil destinadas ao que se chamou de “governo” e de “partidos”.
Chama atenção o destaque dado ao suposto “conhecimento” e “participação” de Yeda como beneficiada direta no desvio de dinheiro do Detran (leia reportagem na página 5). Segundo o MPF, o depoimento prestado pelo então presidente do Detran, Sérgio Buchmann, em 17 de julho, foi de “extrema relevância” para mostrar a concordância e benefício direto dela na fraude. Em conversas telefônicas, o ex-diretor-presidente do Detran Flavio Vaz Netto ameaçava retornar à CPI do Detran para repassar informações sobre pressões de Delson para poder “resgatar o seu Lair” e pagar as contas da governadora.
A participação de cada réu é descrita em itens específicos com o cruzamento de ligações que sustentariam o envolvimento dos suspeitos. O MPF dedicou o maior número de páginas a José Otávio, Yeda e Vargas. Delson, Walna, Rubens Bordini (ex-tesoureiro da campanha de Yeda) e Carlos Crusius (ex-marido) tiveram participação acessória no caso, conforme a ação. Entretanto, o envolvimento teria sido fundamental para Yeda. A partir da página 1.210, o MPF se dedica a apontar as condutas ilícitas de forma genérica, com base especialmente em conversas telefônicas e depoimentos. O texto tenta demonstrar que os citados feriram princípios da administração pública e, por essa razão, se enquadrariam na Lei da Improbidade Administrativa.