06/08/2009 ZERO HORA
Editorial
O Rio Grande nunca passou por um constrangimento desta dimensão. Ao protocolar na 3ª Vara da Justiça Federal de Santa Maria uma ação civil de improbidade administrativa contra a governadora Yeda Crusius e outras oito pessoas com função pública no Estado, a força-tarefa do Ministério Público Federal transformou em denúncia formal as suspeitas que há vários meses recaíam sobre o governo gaúcho. Agora não se trata mais de acusações sem provas, como vinham fazendo integrantes da oposição. No inquérito de mais de mil páginas encaminhado pelo MPF à juíza Simone Barbisan Fortes, estão catalogados documentos e gravações referentes a escutas telefônicas feitas durante as operações Rodin e Solidária, que apuraram irregularidades no Detran e na distribuição de merenda escolar a municípios do Estado. Diante dessas evidências, que infelizmente não foram detalhadas ao conhecimento da opinião pública, os procuradores federais solicitaram liminarmente à juíza que seja levantado o sigilo das ligações que interessam ao processo, pediram também a indisponibilidade dos bens dos réus e o afastamento temporário dos agentes públicos referidos na ação, inclusive da governadora.
Trata-se, portanto, de uma gravíssima e angustiante situação. De um lado, estão governantes e políticos acuados por uma denúncia formal que os incapacita para o exercício normal de suas funções públicas. De outro, estão os cidadãos sentindo-se traídos na confiança que depositaram em seus representantes, sem saber exatamente as irregularidades pelas quais estão sendo denunciados. O mínimo que se espera dos acusados diante da ação proposta ontem é que venham a público pedir a abertura do sigilo das provas e que deem explicações convincentes sobre suas participações nos episódios. Não se compreende, por exemplo, que diante de um fato desta natureza a governadora fique em silêncio, deixando a resposta do governo a cargo de porta-vozes.
Ainda que todos os acusados tenham direito à presunção de inocência e a amplo direito de defesa, já não se pode mais atribuir as denúncias contra eles a articulações movidas por interesses políticos. O Ministério Público Federal, com a legitimidade e a independência que a Constituição lhe assegura, depois de examinar as provas, concluiu pela ação de improbidade administrativa que pede a perda dos bens adquiridos indevidamente pelos denunciados, o ressarcimento da lesão ao patrimônio público, a perda dos cargos, a suspensão de seus direitos políticos e ainda uma multa civil. Ao limitar a natureza da ação à área cível, os procuradores evitam estrategicamente que algum dos acusados se refugie no instituto do foro privilegiado, o que deve transmitir maior transparência para o processo.
É saudável que seja assim, pois o Rio Grande tem pressa de resolver este imbróglio que dificulta a governabilidade e emperra a administração. Neste sentido, é desejável também que o Judiciário, em todas as instâncias requeridas, aprecie a ação com o máximo de celeridade, para evitar que o Estado fique purgando esta ferida pelo restante dos mandatos dos acusados investidos de cargos públicos. Além da governadora, a demanda atinge diretamente quatro ex-presidentes da Assembleia Legislativa – o deputado federal José Otávio Germano, os deputados estaduais Luiz Fernando Záchia e Frederico Antunes, e o presidente do Tribunal de Contas do Estado, João Luiz Vargas. Também estão citados o vice-presidente do Banrisul Rubens Bordini, o ex-secretário Delson Martini, o ex-marido da governadora, Carlos Crusius, e a assessora especial Walna Vilarins Meneses.
O que se espera desses agentes públicos é que exijam acesso ao inquérito para que a população também possa saber quais são as acusações e quais são os seus argumentos de defesa. Só a transparência total poderá atenuar o choque pelo qual passa o Estado neste momento, ao constatar um provável envolvimento direto de governantes e representantes políticos em esquemas delituosos que envergonham a história do Estado. O Rio Grande precisa da verdade. Agora com muito mais urgência do que antes.