01/07/2009 VALOR ECONÔMICO
A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) entrou oficialmente na discussão travada entre a Fazenda paulista e as distribuidoras de energia no caso da substituição tributária nas vendas do mercado livre. A agência reguladora federal emitiu, na semana passada, um parecer contestando a medida paulista e sugerindo ao presidente da República e à Advocacia Geral da União (AGU) que seja promovida uma ação judicial contra o decreto 54.117 do governo de São Paulo. Basicamente a Aneel entende que com o decreto, o governo paulista interfere na regulação do setor, que é premissa da União.
O parecer e uma eventual contestação judicial por parte do governo federal podem dar um novo rumo à discussão. Isso porque as distribuidoras, por meio de sua associação, chegaram a recorrer à Justiça paulista. Mas nem os juízes da primeira instância, nem os do Tribunal, concederam a liminar pedida. A Associação Brasileira das Distribuidoras de Energia Elétrica (Abradee) tenta agora um recurso, segundo o presidente da associação, Luiz Carlos Guimarães.
Sem a liminar, as distribuidoras pediram uma prorrogação da entrada em vigor da medida. Mas a Fazenda estadual manteve o cronograma original e, segundo o diretor-adjunto da administração tributária, Evandro Luís Freire, a medida vai possibilitar um incremento na arrecadação de pelo menos R$ 200 milhões anuais.
Sem a prorrogação, de hoje e até o dia 12, os consumidores livres precisam informar o consumo de energia durante o mês de junho e os valores pagos. Eles podem optar por informar o valor dos seus contratos fechados no mercado livre ou ainda utilizar a tarifa média cobrada pela distribuidora na área em que atua. A Fazenda então vai arbitrar o valor a ser pago de ICMS pela distribuidora, como substituta tributária.
De acordo com alguns técnicos de distribuidoras paulistas, o grande problema é não só a complexidade da adaptação à nova regra como o fato de que no primeiro mês haverá diferimento de cerca de R$ 150 milhões que terá que ser bancado pelas concessionárias. Isso significa que elas teriam que antecipar o pagamento desse valor, no lugar dos consumidores livres.
Freire, da secretaria estadual, diz, entretanto, que as distribuidoras não participaram das discussões para eventuais aperfeiçoamentos à regulamentação do decreto. Elas preferiram ir à Justiça. O diretor da Fazenda paulista diz ainda que o fluxo de caixa das distribuidoras vai aumentar já que o fato gerador para o pagamento do imposto é o da data de vencimento da fatura. "Não queremos com a medida provocar qualquer aumento de custo e se, futuramente, ficar evidenciado que houve um aumento no pagamento de PIS/Cofins, por exemplo, das distribuidoras, podemos negociar uma melhor alternativa", diz Freire.
Um dos pontos apresentados pela procuradoria da Aneel, chancelada pelo diretor-geral da agência, Nelson Hubner, é justamente a possibilidade que ocorra um aumento nas tarifas dos próprios consumidores cativos. Isso pode acontecer, segundo a Aneel, porque com as distribuidoras tendo que arrecadar o ICMS a ser pago pelos consumidores livres de energia, elas tendem a pagar mais PIS/Cofins. Isso ensejaria uma revisão tarifária extraordinária, afetando tanto os consumidores livres como os cativos. É nesse ponto que a Aneel acredita que o governo do Estado de São Paulo está interferindo na regulação do setor.
O parecer, contudo, ainda reforça a questão tributária e diz que as distribuidoras não integram a cadeia econômica de "circulação" de energia em relação às contratações realizadas no ambiente livre. Sendo assim, ficaria caracterizado uma substituição tributária lateral e a responsabilidade de arrecadação só poderia ser atribuída por lei e não por decreto.
As distribuidoras não fazem parte dessa cadeia, segundo a Aneel, porque a aquisição de energia elétrica no mercado livre é independente de seu transporte e deve ser contratada separadamente. Assim, são feitos dois contratos, um entre a comercializadora e o consumidor, e o outro entre a distribuidora e o consumidor, para o transporte.
O presidente da associação dos comercializadores de energia (Abraceel), Paulo Pedrosa, diz que a medida pode perturbar a competição no mercado livre. Isso porque ficaria mais fácil, por parte das distribuidoras, identificar os preços dos contratos, que hoje são sigilosos. Para a associação das distribuidoras, preocupa ainda o fato de que as empresas podem ser afetadas pela inadimplência dos consumidores.
O presidente da Associação dos Grandes Consumidores de Energia (Abrace), Ricardo Lima, diz que a medida não traz impactos financeiros para os consumidores que já pagavam normalmente o ICMS, mas a questão da quebra de confidencialidade é um fator preocupante.