"Ao rever a tributação sobre bens e serviços, folha de pagamento e renda, a reforma pode impactar positivamente o país na agenda de produtividade, geração de emprego e distribuição de renda", diz Appy, em entrevista ao Valor.
O avanço das negociações entre o diretor do CCiF e as lideranças da Câmara dos Deputados acendeu o sinal de alerta no governo, que enviou seu secretário especial da Receita Federal, Marcos Cintra, a São Paulo, na semana passada, para um encontro com Appy. Na sexta-feira, Cintra publicou no Twitter: "O acordo entre Paulo Guedes e Rodrigo Maia para fazer a reforma tributária começou a dar frutos. Eu, Appy, e [Eurico] de Santi [sócio do CCiF] nos reunimos ontem [quinta-feira] na FGV para alinharmos a estratégia. Como disse antes, Executivo e Legislativo trabalhando juntos fazem elefante voar. Reforma tributária vem aí", escreveu Cintra.
O secretário da Receita Federal procurou desfazer a impressão de que a reforma tributária caminha à revelia do Ministério da Economia. Por temer reações de governadores e prefeitos, que sempre resistiram à criação do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) em substituição ao ICMS, recolhido pelo Estados, ao ISS, dos municípios, e aos federais IPI, PIS e Cofins, o governo queria se limitar à unificação dos três tributos da União.
O fato de a Câmara ter abraçado originalmente a proposta do IVA mais amplo, no entanto, sinalizou ao governo que os parlamentares liderarão a empreitada com um custo de mobilização menor para o Palácio do Planalto.
Maia e Appy começaram a conversar ainda durante a campanha eleitoral. Signatário de um manifesto contra a eleição do presidente da República, o economista não terá participação oficial em nenhum grupo de trabalho sobre a reforma, mas atuará como consultor informal da proposta legislativa.
O projeto da Câmara, de autoria do líder do MDB, Baleia Rossi (SP), terá como base a proposta do CCiF ao último anteprojeto de reforma tributária que tramitou na Câmara, sob os auspícios do ex-deputado, Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR).
A Maia, caberá a escolha do relator da reforma tributária, a ser pinçado da bancada dos deputados novatos. O presidente da Câmara também será o fiador do acordo com os líderes partidários para um teto de 'jabutis' que a proposta original pode vir a receber. Na tradição parlamentar, propostas tributárias são o locus, por excelência, de inclusão de isenções e incentivos de setores organizados da economia que contam com lobbies poderosos no Congresso.
Nas reuniões entre Appy e as lideranças parlamentares na semana passada, ficou acordado que o calendário da reforma tributária não ultrapassará a fase das audiências públicas em comissões enquanto a da Previdência não for aprovada. Subsistem, no entanto, muitas dúvidas em relação à intersecção das duas propostas.
Appy defende a criação de uma renda básica a todos os idosos, o que beneficiaria principalmente os mais pobres. O economista cita, como exemplo, o pagamento mensal de R$ 1 mil a todos que completarem 65 anos de idade. Ao mesmo tempo, a faixa até R$ 1 mil seria desonerada a todos os trabalhadores, cobrando-se apenas uma alíquota a ser definida para financiar benefícios como auxílio-doença ou auxílio-maternidade. Trabalhadores que fizerem contribuições à Previdência teriam um valor a receber acrescido ao valor da renda básica de R$ 1 mil, calculado proporcionalmente conforme o salário-base e o tempo de contribuição. Quem contribuir por mais tempo, receberia mais, o que incentivaria a contribuição previdenciária e a formalização de empregos de baixa renda.
"Essa mudança pode resolver muitos problemas, mas precisa acontecer junto com a reforma previdenciária", afirma Appy.
A proposta a ser apresentada por Baleia Rossi, a princípio, se limitará à tributação de bens e serviços, mas tanto Maia quanto Cintra sinalizaram disposição em avançar para a tributação sobre folha de pagamentos e renda. O ministro da Economia, Paulo Guedes, tem defendido a redução da cobrança do Imposto de Renda (IR) sobre o lucro das empresas simultânea à instituição da tributação sobre dividendos, que hoje são isentos.
Para Appy, a medida faz sentido para a atração de investimentos e também contribui para a melhor distribuição da tributação sobre renda. O economista não se furta a afirmar que a carga atual de 34% sobre o lucro das empresas no Brasil é alta.
"Em relação aos países da OCDE [Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico], a alíquota de 34% do Brasil só é menor que a da França, que no ano que vem já será menor que a do Brasil porque aderiu a esse movimento que contaminou o mundo. A vantagem de tributar na empresa e na distribuição faz sentido, porque as empresas não olham apenas para a tributação do lucro distribuído, mas também do reinvestido."
O economista diz que "o problema está nos detalhes". Para Appy, a mudança deve descartar a tributação em cascata e tem de ser estendida para as empresas que pagam o IR pelos regimes simplificados, como Simples e lucro presumido. Por isso, diz, a tributação dos dividendos deve manter também a dedução dos chamados juros sobre capital próprio, porque o mecanismo tenta equalizar o tratamento tributário entre o capital próprio e o de terceiros.
O capítulo mais embrionário das conversas entre Maia, Cintra e Appy é o relativo ao custo fiscal da reforma. O economista defende a tramitação dos três eixos da reforma tributária como a saída ideal para uma reforma positiva tanto do ponto de vista fiscal quanto para a retomada do crescimento econômico.